Como um pássaro de sonho,
Beijaste o mel da minha vida…
Com diáfanas asas, tão suaves,
Acariciaste a minha pele…
Num voo tão delicado,
Alegraste os meus olhos…
Solitário, e tão frágil,
Sobrevoaste-me o coração…
Estendi-te a mão, devagar…
Tinhas medo…
Voamos, dançamos,
Corremos, amamos…
E os dias eram belos,
As manhãs eram claras,
E o medo foi-se embora,
E o Sol voltou de novo…
Veio a noite…
A tua ausência, colibri,
O teu olhar, pequeno pássaro,
Correm-me nas veias…
Por onde voas, colibri?
Estas papoilas feneceram,
Estes jasmins, já secaram,
Sem teus beijos, colibri…
Vindo de parte nenhuma,
Planando ao acaso,
Tão pequena e bela ave,
Mais bela ainda que o luar…
Visitante de flores,
Abelha curiosa e veloz…
Pairas no ar como uma brisa,
Recuas, sem pousar,
Elegante nos manejos…
Pequeno polegar, singelo voador,
Beijando as pétalas,
Namorando o orvalho…
O tempo dum suspiro, e…
Desapareces… e voltas…
Quente, tal raio de Sol
Esquivo qual arco-íris…
Meu colibri…
Meu pequeno beija-flor…
Tão lindo… tão frágil…
Beija-flor, verde, senhor dos planaltos,
À luz d’alva, tocado por um dedo de Sol,
Que acaricia o seu ninho singelo e fino,
Levanta-se no ar, como se uma brisa fosse…
Paira sobre os regatos frescos,
Saltita nos bambus delgados,
Admira as papoilas reluzentes,
Abre as asas, curioso brincalhão…
Desce então, sobre a flor mais bela,
Levita, bebendo amor na pétala pura,
Que destrói, pensando amá-la…
Nos teus lábios puros, meu amor
Também a minha alma quis morrer,
Naquele primeiro e terno beijo…
Chorar, sentir, escrever
Cada palavra, cada sílaba…
Gritar, berrar, escrever
Os tormentos, sofrimentos,
Até cair, até sentir
Os ferimentos e blasfémias…
Ver, no crepúsculo,
A solidão do dia que morre
Escorrer no papel dos sonhos,
O amor perdido…
Um borrão vermelho,
Vomitado pela pena,
Deixado como assinatura,
Enfim liberta da própria alma,
Da sua essência, do seu destino…
Recomeçar, baixar a cabeça,
Humilhar-se, suplicar sem esperança,
Em vão… Esperar, sonhar…
Que ela volte…
Olhar aquela luz branca,
Ao longe… Não mais sentir
Um coração que morre cada dia,
Lentamente… soçobrando…
Cabelo ao vento, olhos molhados,
Lábios balbuciantes,
Sabes que chorei.
Um soluço sufocado na garganta,
Uma angústia que domina,
Um grito que não se ouve.
Dolente, o tempo não passa.
Geme o vento em ais,
Corda partida num braço de guitarra.
Cabeça baixa, alma despedaçada,
Passos que se arrastam,
Perdido na penumbra.
Olhos sem brilho,
Pensamentos distantes,
Um riso que se foi.
Olho-te de longe,
Por vezes…
E à noite, tenho frio.
Sabes-me de cor, lês-me o coração…
Sabes, por isso, que muitas vezes,
Sozinho… ele chora…
Com traços inseguros, desenho-me…
A chuva cai,
O meu olhar torna-se sombrio…
A tinta negra espalha-se
Como se grossas lágrimas fosse…
Já não rio.
A angústia prende-me,
Agarra-me…
Uma enorme sombra negra
Tomou conta de mim…
O coração sangra
E esta pena com que desenho
Parece penetrar-me nas artérias…
O coração quer parar de bater,
Mas não pára!
Bate mais forte ainda
Como se mil diabos
Dançassem, livres,
No seu terreiro.
É um bater doloroso,
Que oprime,
Que cansa,
Que dói…
Perco-me e afundo-me,
Nesta folha que risco,
Tão prenhe de tristeza…
As lágrimas rolam
E esta pintura cuja tinta já secou,
Torna-se líquida
E mistura-se às lembranças
Que navegam nestas águas.
Neste deserto de melancolia,
Sonho com um anjo
De asas abertas
Que me estende a mão…
À minha volta
A tinta escorre,
Perdendo-se, para sempre,
Bem fundo… na alma…